domingo, 13 de fevereiro de 2011

A dança da Mudança

Há tempos escrevi um post sobre as fases da vida de um político (alguém que se dedique à política como ocupação). O objectivo foi fazer um comentário acintoso à pouca vergonha que grassa no nosso meio político, onde boa parte dos protagonistas são corruptos, incompetentes, ladrões e vigaristas. Mesmo alguns que acabam por não ser condenados o são de forma indiscutível. Apenas não são condenados por falta de "prova material" (mesmo que ela exista e seja desconsiderada), por erro processual ou por compadrio.

Bom, nessa altura comentaram o post dizendo que pareciam as fases de uma paixoneta, de alguém que estava apaixonado pela política e se tinha desiludido. Pois bem, acertou na 'mouche'. A minha desilusão é motivada por ter vivido a política de uma forma muito chegada, se bem que como observador. E enquanto mero observador pude manter a equidistância necessária para não me comprometer com nenhum partido, ainda que não possa dizer o mesmo relativamente a ideologias, se bem que também aqui não sou um absolutista. Diria mesmo que cada vez menos a ideologia é a centelha diferenciadora de partidos políticos mas sim a diferenciadora entre partidos e os políticos. Os de antigamente, claro, não os contemporâneos.

A aproximação à política permitiu-me então perceber do que se trata realmente "fazer política". Existe por aí a visão romântica da política, disseminada principalmente pelo cidadão comum, que nunca testemunhou as curvas das entranhas dos processos políticos e que continua a acreditar ingenuamente que a política e os políticos são os agentes legítimos da mudança, aqueles que devem (!) melhorar as condições do país que dirigem e, consequentemente, das pessoas que votam neles. É falso. A função do político é manter o seu partido no poder e alimentar os elementos mais proeminentes desse partido, aqueles que o poderão puxar ao longo da pirâmide. A função dos líderes do partido é manter a ilusão de que, obtido o poder, este vai ser retalhado em pedaços suficientes para todos chafurdarem numa orgia continuada. A função do político no poder - leia-se governo, é gerir os interesses dos elementos mais proeminentes do seu partido e fazer a ponte com os seus homónimos dos restantes partidos garantindo que todos são alimentados de alguma forma. Aliás, se a palavra "partido" não é clara o suficiente, pensem bem no seu significado!

Naturalmente que é preciso dar alguma coisa a quem se encontra fora das elites para que a estrutura da sociedade se mantenha. É a única forma testada e provada de manter a estrutura e hierarquia social sem grandes mudanças, pelo menos em sociedades ocidentais, que a China nesse aspecto tem uma experiência diferente, não se sabe até quando, eu aposto que até ao momento em que a classe média cresça em número suficiente para que não concorde com elites absolutistas e com repartição desigual de rendimentos. Nesse momento a burguesia revoltar-se-á decisivamente, contará com o apoio das classe oprimidas e o sangue lavará a história.

Voltando um pouco atrás, eu não cheguei a ser um desses românticos porque me inoculei muito cedo. Mas continuo a gostar da política de uma forma romântica, como se estivesse apaixonado por uma impossibilidade, por uma Vénus de Milo que, mesmo que tenha existido, já não existe. E, por isso, custa-me a aceitar que a política de hoje não tenha nada a ver com a política que eu amo, porque essa está impregnada de ideologia e de valores que não encontram espaço nem eco na actualidade. Há quem diga que os políticos são um espelho da nossa sociedade mas, não obstante o fundo de verdade que alicerça essa afirmação, eu acho que eles têm que ser muito mais. Têm que ser os nossos líderes, os nossos mentores, têm que ser os melhores de nós, e para serem os melhores têm que se sacrificar em prol da comunidade e não pedir o sacrifício dos outros para si próprio. É uma visão católica-cristã? Provavelmente. Mas é assim que eu entendo a função da política na sua forma mais pura, naquela que daria razão de ser a uma coisa que se chama democracia mas que na realidade nunca o foi, porque para ser efectiva a democracia tem que nos permitir escolher entre o bom e o mau e essa escolha tem estado arredada das nossas opções. Actualmente parece-me que podemos escolher entre o lobo mau e o lobo pior e, ainda por cima, olhamos para o lado, e continuamos a ver lobos de todas as formas e feitios e com diferentes graus de malevolência. Eu, pelo menos, não vejo nenhum capuchinho e angustia-me olhar para todos os partidos e saber qual seria a minha escolha para primeiro ministro (não vai a votos desta feita mas vai lá chegar), sabendo de antemão que é uma escolha em desespero, que na melhor das hipóteses vai trazer tanto de mau como de bom, - está a prová-lo todos os dias no seu cargo actual.

A dança da mudança é necessária mas não vejo como é que uma mudança pode trazer algo de realmente bom, se trocando o par não trocamos também a música.

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