terça-feira, 6 de julho de 2010

O Fixe

Este post deve a sua existência a um amigo meu que me disse que eu o faria ainda antes de eu pensar nisso. Como tal, aqui está o dito, ainda que de forma muito tardia e num contexto absolutamente diferente do esperado :).

Quem é "O Fixe"?

"O Fixe" é aquele indivíduo de quem toda a gente gosta, mas não o suficiente. É uma pessoa que não é líder de grupo mas que tem alguma coisa de que se gosta; ou porque é engraçado, ou porque está disponível, ou porque é bem disposto, ou porque cria boa disposição, ou porque tem um feitio particular que o diferencia dos outros e que, em dadas circunstâncias, o tornam alguém interessante ou de confiança ou apenas porque é alguém que não leva a mal qualquer tipo de brincadeira ou que alinha em qualquer tipo de iniciativa, tornando-se por isso uma vítima preferencial.

"O Fixe" é alguém de quem nos lembramos logo a seguir aos melhores amigos, mas antes dos apenas conhecidos. É alguém a quem somos capazes de telefonar para um jantar a 8 quando ainda só temos sete e precisamos de alguém e já tentámos aqueles que estão mais próximos. É alguém a quem pediríamos o seu guarda-chuva para nos abrigarmos, mesmo que esse alguém ficasse à chuva... provavelmente "O Fixe" passaria pela chuva sem se molhar, transformando-se em apenas mais uma gota, pensaríamos nós... ou num registo mais corriqueiro: "ele não se importa" ou "ele está habituado".

Por isso, "O Fixe" é a vítima preferencial de exploração. Ele não gosta de ser explorado, mas quer sentir-se integrado e esforça-se por isso, sujeitando-se muitas vezes às diatribes dos outros... e às desconsiderações. Costuma ser o primeiro a ajudar, o primeiro a perguntar, o primeiro a oferecer e o primeiro a dar, porque não é egoísta e porque pensa que há um momento para dar e outro para receber e alguém tem que tomar a iniciativa, passar a ponte para o outro lado. Naturalmente, fica à espera que acabem por voltar juntos dessa ponte, em comunhão amistosa e num plano de igualdade, não porque o que se dá e o que se recebe tenha que ser medido e tenha que ser quantificado de igual modo, apenas porque "O Fixe" pensa que a reciprocidade é a única forma saudável de existência. É também por isso que quando o "Fixe" recebe alguma coisa, fica em pulgas para retribuir.

"O Fixe" não é, nunca, a primeira opção. Por isso, "Fixe" acaba por ser uma metáfora. Tal como "simpática" num contexto machista ou sexista. É alguém que apreciamos o suficiente mas não o bastante e, por isso, acaba por se tornar alguém que navega nas franjas dos grupos sociais, muitas vezes sem pertencer de facto a lado algum.

Os filmes americanos e a cultura anglo-saxónica utilizam muito um conceito semelhante, o do "underdog", mas com uma variante: o "underdog" é um "Fixe" que, em dado momento, consegue atingir alguma notoriedade, porque demonstrou ser melhor que os outros em alguma coisa. Só que nesse preciso momento deixa de ser "underdog". Enquanto "underdog" pode ser tolerado, mas nunca reconhecido.

Eu gosto de "Fixes". Às vezes sou um.

Já agora, o "Fixe" a que o meu amigo se refere é um empregado de mesa que nos serviu um destes dias. Num jantar onde quase tudo correu mal ao tipo, porque se esqueceu de alguns pratos, porque trocava os pratos, porque se enganou na mesa atribuída, porque entretanto vinha a responsável ver o que é que se passava, entre outras peripécias que já se perderam da memória, acabou por tentar ser mais simpático e prestável do que era exigido, por exemplo, dizendo que depois compensava e que se esqueceria de colocar os cafés na conta, contando a história da sua vida até à exaustão, não me refiro à exaustão do tema, mas à exaustão da paciência do meu amigo. Neste caso o "Fixe" foi um papel desempenhado pelo empregado de mesa, para tentar apagar a sua inexperiência e o mau serviço que daí resultou e nada tem a ver com o outro "Fixe".
... ... E como eu sou um bocadinho chato no que respeita ao serviço em restaurantes... ... e tenho um historial de reclamações... ...esperava-se que eu reagisse ao mau serviço... só que não o fiz... e não o fiz porque cada vez que o empregado de mesa cometia um erro procurava de imediato corrigi-lo e compensar esse erro de alguma forma, nem que fosse com paleio. E essa atitude positiva é de louvar e é contrária às trombas com que os empregados habitualmente recebem as reclamações, que é o que me faz passar de alarme amarelo para alarme vermelho num segundo. Não admito que um empregado de mesa não atenda uma reclamação com lisura, respeito e interesse, afinal a culpa pode não ser dele mas seguramente não é do cliente.

Enfim, ambos os "Fixes" precisam de um «fix», é o que é!

1 comentário:

Ana Clara disse...

Muito Bom! Mas ainda bem que há o Fixe! :)