sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Elegia aos Líderes de Portugal ou Carta de Desamor àquilo em que nos tornámos

Nascemos no cimo do monte e descemos aos trambolhões, empurrando o fundo do quadrado com o nosso peso, esmagando muçulmanos e castelhanos com as nossas barrigas rotundas. Chegados ao mar inventámos um rectângulo só para nós, mas não era suficiente, precisávamos de formas mais modernas, mais abstractas. Acabámos por desenhar o mundo juntando continentes num abraço circular de circumnavegação, apenas para desbaratar tudo e regressar em debandada à origem e se não voltámos ao quadrado foi mera coincidência, que quadrados nos mantemos ainda hoje, a viver dentro do rectângulo a que resolvemos chamar Portugal.

Por existirmos e por sermos quem somos, quero agradecer às grandes figuras da nossa nação que continuaram a cultivar a portugalidade!

Obrigado D. Sebastião por teres desaparecido sem apelo nem agravo, dando início à orfandade de que ainda hoje padecemos. Denotaste visão, daquelas que moldam as grandes nações, ao criar uma escola em que a irresponsabilidade é a maior virtude.

Obrigado Salazar, por nos mostrares as virtudes da liberdade. Não há como ficarmos sem algo para lhe sentirmos a falta e tu educaste-nos pela via do exemplo, iluminando os nossos espíritos pela dor e pelo medo.

Obrigado Cavaco, o rei do alcatrão. Nunca tanto dinheiro de outros foi por nós derretido em alcatrão e em formação. O país ficou mais perto mas nem por isso mais esperto. Pelo menos o bolo-rei do teu reinado foi vintage.

Obrigado Guterres por teres chamado os boys pelos nomes... (todos sabemos porque não os chamaste pelos números) ainda que tenha sido quando os nomeaste para o teu desgovernado governo. O teu legado evidenciou a indecisão à portuguesa, que nos consome a todos. No teu caso estender-se-ia, seguramente, até à escolha entre rezar um pai-nosso ou uma avé-maria.

Obrigado Santana e Durão, por personificarem a política de terra-queimada onde a fuga é uma estratégia legítima, seja fuga em frente, para os lados, para dentro ou para fora, mas sempre sem olhar para trás. Como há que olhar sempre em frente e, é sabido, todos temos a memória curta, a incompetência e a imbecilidade vão-se perpetuando ciclicamente – afinal somos todos iguais, se bem que uns mais inimputáveis que outros!

Obrigado Sócrates, ó nosso rei Leónidas, por apregoares a estabilidade e a confiança no futuro enquanto nos despenhamos no precipício financeiro, como as manadas de outrora, acossadas e encurraladas pelos caçadores, se suicidavam cegamente. A palavra cicuta diz-te alguma coisa?



Obrigado Zé, meu bom e dócil Povinho português por parires e tolerares os teus abortos genéticos. Talvez seja a altura, porém, de baixares essa mãozinha e bateres antes uma punheta.

2 comentários:

Ana Guedes disse...

Resumo brilhante!

Ana Clara disse...

Obrigada, sr Bonito pela clareza das ideias que o zézinho não entenderá !